Era uma vez uma gota cheia de sede.
Não faz sentido, mas acreditem que assim era.
Esta gota de água queria matar a sede a alguém que tivesse muita sede.
Desejo grande, desejo único que a arredondava mais e mais, e a enchia de fé como um coração palpitante.
Mas não havia meio.
Caiu na copa de uma árvore e foi escorrendo de ramo em ramo, pling, pling, pling, como uma lágrima feliz.
Até que chegou a uma folha, mesmo por cima de um ninho.
Caio? Não caio? Deixou-se ficar, a ver no que dava.
A casca de um ovo estalou e um passarinho rompeu, aflito, lá de dentro, de bico aberto, num grito mudo.
– Caio – decidiu a gota.
Soltou-se da folha para a garganta aberta do passarinho, que a engoliu e, logo em seguida, piou, agradecido.
Foi o passarinho, tempos depois, que me contou esta história.
António Torrado